domingo, 20 de abril de 2014

Não é Noé, né?

Aproveito o feriado bíblico para fazer minha crítica (pesada) a Noé (Noah, 2014). Bom... já aviso que se você acha que vai ver bichinhos lindos sendo salvos pelo santo Noé, está enganado. Você verá um sociopata com uma fé cega que recebe ajuda de monstros aracnóides de pedra. Impossível não odiá-lo do meio para o final do filme.

Parece que os roteiristas seguiram uma versão que está no Livro de Enoque e, com isso, trouxeram novos elementos à história que todos sabem o fim, mas não sabem como ocorreu exatamente. Um desses novos elementos são os guardiões angelicais que decidiram seguir Adão e Eva após sua expulsão do Paraíso e acabaram se tornando os tais monstros. E que tal as pedrinhas brilhantes?

É importante dizer que o filme fala sobre a dualidade do homem (bom e mau). A fé divina do bondoso Noé (Russell Crowe) confronta a necessidade humana de poder do maligno Tubalcaim (Ray Winstone), e esse confronto se espalha entre os filhos de Noé. Percy Jackson e Hermione Granger... oops... Cam e Ila podiam ser atores desconhecidos como foi Shem (Douglas Booth), porque estão fracos e clichés. E Anthony Hopkins já está ficando Matusalém mesmo!

Sorte deles (e nossa!) que existe o talento e a beleza (magra demais) de Jennifer Connelly. Ela interpreta magistralmente a esposa de Noé e transforma um personagem bíblico sem nome e sem importância* na figura que nos representa. Ela é a personificação do amor humano e, no fundo, é ela que vence tanto a fé cega quanto o poder insano, e não o livre arbítrio de Noé. É ela que perdoa, mesmo quando nós não somos capazes de fazê-lo.

Sobre os animais do filme... eles estão lá, são parte importante e até trazem questões contemporâneas sobre o desgaste do planeta, mas não são o foco. Achei bem interessante a forma como os animais ficaram na Arca: dormindo, é claro! Ou você nunca teve dúvidas de como um leão e uma ovelha ficaram juntinhos? Ou de como se limpava a sujeira dos pássaros? Ou de como alguém ficaria lá dentro com mosquitos e aranhas? Interessante também mostrar que os animais que morrem no filme eram criaturas que não existem hoje, tentando provar que só se salvaram as espécies na Arca. Fiquei só com um questionamento: matar para comer é natural, e não um pecado. Predadores carnívoros fazem isso (sorry vegans...). A crueldade e as más intenções é que devem ser vilanizadas.

No geral, achei o filme chato, mas fiquei pensando: como eu gostaria que fosse esse filme? Mais religioso ou espiritual, nem pensar! Até porque Aventuras de Pi foi bem mais relevante nesse sentido pra mim. Mais épico? Impossível, senão teríamos discursos gladiadores de Crowe novamente. Refleti muito e não sei o que faria pra mudá-lo, mas acho que ele poderia ter sido um filme pra TV ou curta-metragem...

* A esposa de Noé raramente aparece em textos bíblicos. Segundo a tradição judaica, ela seria uma mulher cananita chamada de Noéma ou Naamá (Na'amah, cheia de beleza). Há quem a identifique como proveniente da descendência de Caim, sendo irmã de Tubalcaim que era filho de Lameque. Se isso tivesse sido colocado no filme ia dar um nó genealógico! Por ter sido considerada de menor importância, o seu nome não vem mencionado no Pentateuco ou no Torá. No livro dos Jubileus, o seu nome é conhecido por Enzara e seria sobrinha do Patriarca. Detalhe: o diretor, Darren Aronofsky é judeu.

Um comentário:

Wallace disse...

Gostei da frase; "matar para comer é natural, e não um pecado. Predadores carnívoros fazem isso (sorry vegans...). A crueldade e as más intenções é que devem ser vilanizadas."