segunda-feira, 21 de maio de 2018

Arte?

Texto produzido em 21 de maio de 1996 para a disciplina História da Arte Contemporânea, do Prof. Geraldo Andrade, enquanto eu estudava no primeiro ano da ESDI.

É muito difícil dar um significado para a palavra arte. É um conceito muito abstrato e flexível, porque varia dentro de uma conjuntura internacional própria e em relações interculturais.

A arte sempre seguiu regras, que, por sua vez, seguiam os padrões de estética da sociedade. Às vezes, ela assumia um caráter próprio, bem elitizado, por receber as influências de uma minoria intelectual que a moldava. O que chamamos de "moda", por exemplo, é algo ditado por alguns da sociedade que desejam impor seus padrões a toda uma sociedade. No entanto, já não existem mais regras fundamentais ou critérios de julgamento. A arte continua com sua força de ilusão, sua capacidade de negar a realidade, perdendo o sentido e a finalidade, para ganhar uma nova forma idealizada.

Percebemos que, sem critério algum, fica difícil haver uma troca de informações no meio estético. A coexistência de diversas tendências artísticas num mesmo espaço cultural nos leva a aceitá-las simultaneamente com uma profunda indiferença. Essa espécie de inércia da sociedade atinge a arte num êxtase agoniante, imobilizada pela própria imagem e riqueza de seu passado, deixando as liberdades formais e conceptivas se misturarem com outros estilos sem nenhum controle ou com um controle imóvel.

O mais interessante é o fato de que os objetos que já foram tachados como arte continuam sendo cultuados como obras-primas. A sociedade volta a entrar em inércia e não revê os valores artísticos. As mudanças de pensamento e de critérios de julgamento poderiam transformar claramente uma obra em "uma simples brincadeira de criança que qualquer um faria". O exemplo "Stan Lee" é perfeito para explicar isso. Talvez suas primeiras histórias em quadrinhos não o façam um artista. No entanto, quando ele realmente entrou para o universo das HQs, toda e qualquer criança que lesse as maravilhosas sagas de super-heróis o considerava mais do que um artista. Será que seus desenhos modernos e seus textos fictícios não podem ser considerados arte? Depende de quando e a quem se pergunta.

A evolução do homem, em função da curiosidade interior, tornou o mundo potencialmente criativo. Sem dúvida, a curiosidade "puxou" a criatividade para perto, onde as experiências podiam ser então melhor observadas e concluídas. Mas o homem experimentou a industrialização da arte e "estetizou" toda a insignificância do mundo. Essa mercantilização que se viu ao redor da arte mudou o destino da organização semiológica. Qualquer coisa que fosse uma força de expressão, um signo, uma consideração de uma das tendências artísticas sofria ação do mercado. Acabou-se por vender o marginal, o banal como forma de cultura, de ideal estético. A arte ganhou o valor do mercado, perdendo o valor estético do signo.

Não é a essência da arte que está desaparecendo ou suas concepções desmaterializando. A estética se proliferou por toda a parte e ganhou uma personalidade mais operacional. É assim que a arte sobrevive: modificando-se de acordo com as regras do jogo, forçando até seu próprio desaparecimento. A publicidade jamais poderia ser chamada de arte, mesmo que tornemos essa última o mais mercantil possível. Os ideais fundamentais de arte e publicidade entram em choque. Não há passagem de emoção e sensibilidade numa propaganda, assim como a arte, em seu sentido mais puro, jamais será artificial.

É inútil buscar coerência e destino estético na nossa arte. É impossível julgar belo e feio, condenando a humanidade à indiferença. Essa indiferença gerou o hiper-realismo atual da arte. Não se cultua mais o belo ou o feio. Prefere-se o kitsch e o fascinante, o hiperreal. A arte-pop ganhou força com isso, pois elevou-se a potência irônica do realismo.

Essa elevação potencial mexe no meio mercantil. As leis do valor também se elevam, o que é mais caro se torna mais caro e os preços ficam exorbitantes. Entra aí o modismo. Essa alteração dos valores supervaloriza alguns artistas, inferiorizando outros, iniciando a arte-xerox, ou seja, uma arte copiada que penetra no paradoxo das regras artísticas.

A arte gira em torno de dois mercados: o da hierarquia dos valores e o da especulação financeira, ficando acima do belo e do feio. Talvez não seja por aí que a arte se desenvolve. Ela cresce por si só, com seus fundamentos de sensibilidade e transmissão de uma mensagem, desafiando os valores, realmente ficando acima deles. Os mercados reutilizam essa arte como uma forma de superar esses valores para controlar o capital flutuante e ficar, ainda, acima do bem e do mal.

Um comentário:

Graça disse...

Mais uma vez me encontro diante de um texto produzido há pouco mais de 20 anos e mais uma vez me pergunto se o autor ainda pensa da mesma forma.
Sempre gostei de Arte, mas fui me interessar mais pelo seu sentido estimulada por pessoa da família. Foi a partir daí que comecei a ler sobre o sentido da Arte e guardei um texto, que reproduzo abaixo, e que se encaixa com o que penso sobre o tema.

"Somente pela arte podemos sair de nós mesmos, saber o que um outro vê desse universo que não é o mesmo que o nosso e cujas paisagens permaneceriam tão desconhecidas para nós quanto as que podem existir na lua. Graças à arte, em vez de ver um único mundo, o nosso, vemo-lo multiplicar-se, e quantos artistas originais existirem tantos mundos teremos à nossa disposição, mais diferentes uns dos outros do que aqueles que rolam no infinito e, muitos séculos após se ter extinguido o foco do qual emanavam, chamasse ele Rembrandt ou Ver Meer, ainda nos enviarão o seu raio especial".

Marcel Proust, in 'O Tempo Reencontrado'