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segunda-feira, 27 de junho de 2022

A MORAL AMORAL

Para os dias atuais...



sexta-feira, 19 de julho de 2019

Desequilíbrio estável

Em parceria com o Zentrum Paul Klee, de Berna, na Suíça, o Centro Cultural do Banco do Brasil trouxe pela primeira vez na América Latina mais de 100 obras do suíço Paul Klee (1879-1940), dentre elas pinturas, gravuras, fantoches e, em sua maioria, desenhos. A exposição está na filial do Rio de Janeiro, após temporada de sucesso em São Paulo, e ainda irá passar por Belo Horizonte e Brasília. Klee transitou por diversos movimentos de vanguarda e fica até difícil encaixá-lo em um estilo definitivo, porém, é indiscutível sua importância na Arte Moderna e Contemporânea. Por essa razão, receber essas obras é algo a se comemorar, pois o público brasileiro carece da presença de grandes artistas internacionais.


Dito isso, é preciso que tenhamos uma avaliação mais criteriosa sobre as exposições e as obras que chegam no Brasil. Das 123 obras, talvez 5% tenha alguma relevância artística. A partir desse dado já é possível ter duas formas de reflexão: na primeira, celebramos o contato com tantos trabalhos inéditos que amplia os conhecimentos sobre o artista; e, na segunda, entendemos que são obras, em sua maioria, de menor valor ou importância que precisavam sair dos acervos para elevar o valor de mercado e “levar cultura” para os brasileiros. O interessante de ambas reflexões é que elas não são excludentes, mas sim potencializadoras de um questionamento maior sobre a disponibilização de cultura em nosso país. Entretanto, a segunda reflexão se torna mais vigente quando nos atentamos para o projeto expográfico realizado no Rio de Janeiro, marcado por três pontos bem simples.

A primeira sala da exposição trata dos desenhos iniciais de Paul Klee, mostrando como ele saiu de um desenho academicista – inclusive com uma belíssima marina — para suas experimentações visuais. No entanto, ficamos sem saber a idade que Klee desenvolveu os desenhos, porque o texto de introdução do artista foi preterido em nome dos textos curatoriais. Mesmo que a ideia da exposição fosse quebrar com a ideia de cronologia (o que não foi) ou exposição didática, a informação fica perdida e tanto a sala quanto as obras ficam mal aproveitadas. Detalhe: o texto de introdução ficou na terceira sala.

Ao passar para a segunda sala (uma espécie de antessala) somos apresentados aos alardeados (e muito interessantes) fantoches de Klee... mas em forma de vídeo, porque eles mesmo foram colocados no fim da terceira sala, totalmente deslocados. Se tinha alguma contextualização, ela não apareceu.

Por fim, um facsímile de péssima reprodução do “Angelus Novus”, de Klee, encerra com a certeza de que o material é realmente de deixar dúvidas. Ficam as perguntas: para que o facsímile? Só para mostrar o que Walter Benjamim falou sobre ele, validando-o como se ele precisasse disso? Seria para dizer que tinha alguma coisa importante do artista? Bom, a exposição, ao menos, oferece ao visitante a oportunidade de ver a última obra de Klee, “A última natureza morta”, de 1940, ainda inacabada. Só não sei a razão de estar completamente perdida na penúltima sala sem qualquer destaque.

Sem título (Última natureza morta), óleo sobre tela de Klee (1940).

Uma exposição que possui uma logística gigantesca – por exemplo, a temperatura do local não pode ser superior a 20° para evitar danos aos quadros e impedir que a tinta derreta – de um artista tão importante merecia um olhar curatorial mais cuidadoso. Isso seria capaz de nos levar àquela primeira reflexão (e quem sabe, nem chegarmos à segunda), onde celebramos e curtimos a vinda dessa arte seminal.

segunda-feira, 15 de julho de 2019

Falo

Há muito não escrevo por aqui por exclusiva falta de tempo. Além de trabalho, estou envolvido numa pós-graduação para ampliar meus conhecimentos. No entanto, o que realmente está me tirando o tempo é algo que me deixa muito feliz: em março de 2018, criei e lancei a revista FALO MAGAZINE, uma publicação gratuita online que busca discutir a nudez masculina na Arte.

Sim, a marca lembra um pênis.

Não sei se você se lembra, mas em 2017 tivemos três eventos complicados no mundo da Arte:
  1. O performer Maikon K foi preso ao realizar sua performance onde estava nu, sendo que estava dentro de uma instituição que aprovou e autorizou sua expressão artística.
  2. A exposição Queermuseu foi cancelada em Porto Alegre após censura popular e privada.
  3. O performer Wagner Schwarz foi perseguido nas redes sociais (com ameaças de morte) após um vídeo de sua performance nu dentro de um espaço museológico que autorizou a expressão ser viralizado com a presença de uma criança.
É mais do que sabido que existe uma perseguição (imbecil) às questões de gênero, porém, nesses casos, a nudez masculina foi o ponto de maior incômodo. Esse foi o gatilho para uma rápida pesquisa na História da Arte sobre o assunto que me revelou inúmeros conhecimentos que parecem ficar deliberadamente escondidos como uma forma de controle. Afinal, onde estão os homens nus na Arte? Ficaram somente nas estátuas da antiguidade clássica greco-romana? Não. E é por isso que a revista está aí, chegando à sua oitava edição.


A revista tem periodicidade bimestral porque eu faço tudo sozinho: edição, redação, reportagem, design, marketing, sirvo cafezinho e faço a faxina. Não é nada fácil, mas é prazeroso... mesmo sendo CUSTO ZERO. É... isso mesmo... além de ser gratuita, eu não ganho absolutamente nada com ela. Minha vocação como professor se sobressaiu aqui, sendo adepto do conhecimento livre.

Então vá lá no site e faça o download. Ou, então, siga no Facebook e no Instagram. Além de conhecer novos artistas que trabalham com a nudez masculina em diversos meios (pintura, desenho, escultura, fotografia etc), você ainda vai saber mais sobre História da Arte, sobre livros e sobre o FALO... afinal, a revista é sobre ele.

PS.: Feliz Dia do Homem! (é... 15 de julho é esse dia aí)

quinta-feira, 4 de outubro de 2018

Djavaneando

Em janeiro de 2017 fiquei de contar aqui sobre um projeto que tinha meu ídolo máximo como referência. E acabei esquecendo. Então aí vai... Ano passado lancei o projeto "guarda-chuva" DJAVANEANDO, onde fiz/faço/farei releituras a partir da obra do poeta Djavan.

O primeiro projeto dentro do projeto foi AZUL. Nele eu identifiquei a cor azul nas letras do músico e fiz uma correlação com as cores Pantones do universo gráfico.


O segundo projeto foi o djamor. Todo mundo sabe que Djavan é um mestre nas palavras do coração. Então frases são transformadas em simples imagens para o livre compartilhamento. Esse é um projeto em construção atualizado duas vezes ao ano.


E hoje – Dia do Animais e de São Francisco de Assis – eu lancei o projeto bicho solto. Nele eu mostro como Djavan registra os animais ampliando suas existências.


Sempre que eu puder, vou mergulhar na obra dele. É só amor. #spreadthelove

segunda-feira, 21 de maio de 2018

Arte?

Texto produzido em 21 de maio de 1996 para a disciplina História da Arte Contemporânea, do Prof. Geraldo Andrade, enquanto eu estudava no primeiro ano da ESDI.

É muito difícil dar um significado para a palavra arte. É um conceito muito abstrato e flexível, porque varia dentro de uma conjuntura internacional própria e em relações interculturais.

A arte sempre seguiu regras, que, por sua vez, seguiam os padrões de estética da sociedade. Às vezes, ela assumia um caráter próprio, bem elitizado, por receber as influências de uma minoria intelectual que a moldava. O que chamamos de "moda", por exemplo, é algo ditado por alguns da sociedade que desejam impor seus padrões a toda uma sociedade. No entanto, já não existem mais regras fundamentais ou critérios de julgamento. A arte continua com sua força de ilusão, sua capacidade de negar a realidade, perdendo o sentido e a finalidade, para ganhar uma nova forma idealizada.

Percebemos que, sem critério algum, fica difícil haver uma troca de informações no meio estético. A coexistência de diversas tendências artísticas num mesmo espaço cultural nos leva a aceitá-las simultaneamente com uma profunda indiferença. Essa espécie de inércia da sociedade atinge a arte num êxtase agoniante, imobilizada pela própria imagem e riqueza de seu passado, deixando as liberdades formais e conceptivas se misturarem com outros estilos sem nenhum controle ou com um controle imóvel.

O mais interessante é o fato de que os objetos que já foram tachados como arte continuam sendo cultuados como obras-primas. A sociedade volta a entrar em inércia e não revê os valores artísticos. As mudanças de pensamento e de critérios de julgamento poderiam transformar claramente uma obra em "uma simples brincadeira de criança que qualquer um faria". O exemplo "Stan Lee" é perfeito para explicar isso. Talvez suas primeiras histórias em quadrinhos não o façam um artista. No entanto, quando ele realmente entrou para o universo das HQs, toda e qualquer criança que lesse as maravilhosas sagas de super-heróis o considerava mais do que um artista. Será que seus desenhos modernos e seus textos fictícios não podem ser considerados arte? Depende de quando e a quem se pergunta.

A evolução do homem, em função da curiosidade interior, tornou o mundo potencialmente criativo. Sem dúvida, a curiosidade "puxou" a criatividade para perto, onde as experiências podiam ser então melhor observadas e concluídas. Mas o homem experimentou a industrialização da arte e "estetizou" toda a insignificância do mundo. Essa mercantilização que se viu ao redor da arte mudou o destino da organização semiológica. Qualquer coisa que fosse uma força de expressão, um signo, uma consideração de uma das tendências artísticas sofria ação do mercado. Acabou-se por vender o marginal, o banal como forma de cultura, de ideal estético. A arte ganhou o valor do mercado, perdendo o valor estético do signo.

Não é a essência da arte que está desaparecendo ou suas concepções desmaterializando. A estética se proliferou por toda a parte e ganhou uma personalidade mais operacional. É assim que a arte sobrevive: modificando-se de acordo com as regras do jogo, forçando até seu próprio desaparecimento. A publicidade jamais poderia ser chamada de arte, mesmo que tornemos essa última o mais mercantil possível. Os ideais fundamentais de arte e publicidade entram em choque. Não há passagem de emoção e sensibilidade numa propaganda, assim como a arte, em seu sentido mais puro, jamais será artificial.

É inútil buscar coerência e destino estético na nossa arte. É impossível julgar belo e feio, condenando a humanidade à indiferença. Essa indiferença gerou o hiper-realismo atual da arte. Não se cultua mais o belo ou o feio. Prefere-se o kitsch e o fascinante, o hiperreal. A arte-pop ganhou força com isso, pois elevou-se a potência irônica do realismo.

Essa elevação potencial mexe no meio mercantil. As leis do valor também se elevam, o que é mais caro se torna mais caro e os preços ficam exorbitantes. Entra aí o modismo. Essa alteração dos valores supervaloriza alguns artistas, inferiorizando outros, iniciando a arte-xerox, ou seja, uma arte copiada que penetra no paradoxo das regras artísticas.

A arte gira em torno de dois mercados: o da hierarquia dos valores e o da especulação financeira, ficando acima do belo e do feio. Talvez não seja por aí que a arte se desenvolve. Ela cresce por si só, com seus fundamentos de sensibilidade e transmissão de uma mensagem, desafiando os valores, realmente ficando acima deles. Os mercados reutilizam essa arte como uma forma de superar esses valores para controlar o capital flutuante e ficar, ainda, acima do bem e do mal.

sexta-feira, 27 de abril de 2018

Arte ao Lado: Otávio Oliveira

Otávio Oliveira é o filho do meio, o “mais diferente dos três irmãos”, como ele diz. Era considerado o artista da família, pois, ainda criança, demonstrou facilidade em desenhar tudo que o cercava. Com o tempo, se interessou por música e aprendeu vários instrumentos musicais (quase se formou em violão clássico). Lia avidamente todos os livros que caíam na sua mão. Na hora de escolher uma carreira, sabia que necessitava fazer algo que o sustentasse, porém, era imprescindível que houvesse algum tipo de arte associada à profissão.

A odontologia apareceu como a “resposta perfeita”. Tornou-se um dentista pós-graduado em prótese, habilitando-o a lidar com a correção funcional e estética dos problemas causados pelas perdas dentária. A profissão permitiu uma vida digna a seus filhos e supriu sua necessidade de estar perto da arte.

Ele sabe que existe um grande lado de ciência no que faz. Após a parte técnica e a parte funcional do trabalho, entra a escultura dos elementos perdidos que deve estar em harmonia não só com os outros dentes, mas com todo o rosto. É preciso estudar a face de cada pessoa individualmente, pois “perceber suas peculiaridades é vital na criação não só de um sorriso bonito, mas de um sorriso que represente a verdadeira felicidade daquele que sorri”

Para Otávio, a arte é literalmente transformadora:
“Só a arte pode nos dar a sensibilidade necessária para perceber tais nuances. Tê-la dentro de si é um privilégio. Me sinto abençoado por isso.”
E é abençoado mesmo porque a arte transborda dele. Otávio foi meu dentista por um período curto, mas nos reconectamos através das redes sociais. Foi onde eu conheci o pai de família, o romântico, o músico, o cantor, o escultor, o pintor… o artista que ele é por completo.


quinta-feira, 8 de fevereiro de 2018

O ziriguidum ao lado

O Carnaval está chegando e a revista do Arte ao Lado está voltando! Então, mexa-se! Tem dança, tem teatro e – é claro – arte na Sapucaí!



"Ô abre-alas que eu quero passar..."

segunda-feira, 30 de outubro de 2017

Pra onde foi a Arte grega?

Em 2014, fiz o curso "Introdução à Arte Moderna: do Néoclássico ao Impressionismo", na PUC-RJ. Como conclusão, escrevi um trabalho sobre a arte grega chamado Os anos perdidos da Arte grega: A transformação dos cânones ocidentais clássicos em uma produção anticlássica, onde investigo os rumos que tomaram os preceitos considerados clássicos ao longo dos séculos.



É longo, mas vale a pena pensar nesse tipo de transformação – da referência ao ostracismo – que o tempo histórico nos oferece.

sábado, 14 de outubro de 2017

Arte ao Lado: Erick Grigorovski

Com formação em design pela ESDI, é claro que Erick Grigorovski iria sistematizar sua produção artística… quer dizer… seus "filminhos" de animação. Independente do projeto, seja profissional ou pessoal, Erick mantém um processo de criação e produção bem semelhante: do briefing à pesquisa, do esboço no papel à finalização digital. Porém, como ele mesmo diz:
“Nos meus projetos pessoais, a diferença é que o cliente sou eu. E como nem sempre sei exatamente o que quero, de modo geral, o briefing vem a partir de conversas com amigos”.
Seus "filminhos" de animação são sem orçamento ou ambições, mas com muita vontade de contar histórias ao lado de amigos queridos. Então, somente após enxergar o projeto na sua frente com roteiro, artes conceituais, storyboard e cronograma, é que decide se tem motivação suficiente para colocar todo seu esforço nos meses seguintes e evitar cair na armadilha frustrante do engavetamento de um projeto pessoal. Por exemplo, Terra Incognita e Uruca levaram 10 meses, enquanto Entre Nós levou 18 meses e mais 10 meses ilustrando e escrevendo o blog da protagonista.


Em nenhum momento, Erick fala sobre fazer arte. Parece enxergar o que faz quase como um trabalho. Mas, quando fala que “faço porque quero contar aquela história, daquele jeito”, mostra sua motivação interior. Mesmo que um trabalho profissional de design, ilustração ou videografismo também o divirtam, é nesses "filminhos" de animação que realiza seu ato de arte. Não só no contar uma história, mas na dedicação à ilustração e no envolvimento pessoal.


Erick é de casa. Tem até marcador aqui no blog. Estudamos juntos na ESDI e passamos poucas e boas nessa vida. E é por isso que não entendo o diminutivo que ele usa para suas animações. Porra, cabeça, tu ganhou prêmio com teus “filminhos”! Vai estrear HOJE o novo Uruca no Rio Mountain Festival E no Inkafest, em Lima, no Peru! O que você faz é incrível! É arte! Você dá movimento ao desenho, vida à sua imaginação! Força na motoca!

sábado, 30 de setembro de 2017

Os olímpios

Segunda metade do século 19.

Alguns pintores resolveram parar de idealizar o cotidiano com alegorias e metáforas para fazer obras que mostrassem a realidade e representassem a vida como ela é (que deu no movimento artístico denominado Realismo). Em 1863, Édouard Manet pintou Olímpia (óleo sobre tela, 1,3 x 1,9 m, Museu d'Orsay), inspirado pela Vênus de Urbino de Ticiano e pel'A maja desnuda de Goya. Dois anos depois, Olímpia foi selecionada para ser exibida no Salão de Artes de Paris.


IMORAL! VULGAR!

Esses foram os xingamentos mais leves que o precursor do Impressionismo recebeu dos críticos conservadores da época.

O nu artístico sempre existiu, porém, de forma acadêmica (como estudos do corpo humano com modelos vivos), alegórica (em cenas mitológicas) ou exótica (mostrando povos distantes e considerados primitivos). Quando Manet representou uma prostituta de luxo fora desses três contextos, ele deslocou o nu do imaginário profano para a realidade pudica (e hipócrita). BLASFÊMIA!

E ele fez mais: ao colocar a mulher olhando diretamente o espectador com a mão tampando seu sexo, ele deu poder à ela. É ela quem manda no sexo, é ela que dá acesso e controla sua própria sexualidade. QUE ABSURDO (para uma sociedade machista e patriarcal)! UM ESCÂNDALO!

O escritor francês Émile Zola saiu em defesa do pintor:
Quando outros artistas corrigem a natureza pintando Vênus, eles mentem. Manet perguntou a si mesmo porque deveria mentir. Por que não dizer a verdade?
Manet ficou arrasado com as reações do público. Seu amigo, o poeta francês Charles Baudelaire, ficou preocupado:
Manet tem um grande talento, um talento que resistirá. Mas ele é frágil. Pareceu desolado e atordoado pelo choque. O que me impressiona é a alegria de todos os idiotas que acreditam que ele foi vencido.
O pintor chegou a se isolar, mas (ainda bem) foi tirado do ostracismo pelos impressionistas capitaneados por Bethe Morisot, Camille Pissarro e Claude Monet (que foi responsável por comandar uma campanha em 1890 para que a tela fosse comprada e doada para coleções públicas). Ele deveria ter conversado mais com Gustave Courbet, pintor da obra A origem do mundo, censurada pelo Google e pelo Facebook...

Corta, então, para o início do século 21.

Em julho de 2017, o artista Maikon K (um dos nomes mais respeitados e consagrados da performance no Brasil contemporâneo), realizou em um projeto privado a apresentação da DNA de DAN, na qual fica nu com o corpo coberto de um líquido que se resseca aos poucos, até, ao fim, se quebrar, revelando a pele do artista. Foi preso de forma truculenta por ATENTADO AO PUDOR e OBSCENIDADE, mas fez questão de declarar:
Podem me colocar diante de um juiz. Eu sei que eu não fiz nada de errado nem nada pelo qual eu deva me envergonhar. Eu estava trabalhando, e minha função é essa: perturbar a paisagem controlada dos sentidos. O meu corpo afronta os seus canais entupidos, o seu ódio contido, mesmo estando parado. Porque vocês nunca vão me controlar e eu pagarei o preço, eu sei, eu sempre paguei. Porque parado ali, nu, imóvel no meio da praça, suas vozes me atravessam, suas piadas estúpidas tentam me derrubar, sua indiferença me faz rir, seu embaraço me dá dó, mas eu continuo em pé.
Em setembro de 2017, o artista Wagner Schwartz realizou em um museu de arte a apresentação Le Bête, na qual manipula uma réplica de plástico de uma das esculturas da série "O Bicho", de Lygia Clark, e se coloca nu, vulnerável e entregue à performance artística, convidando o público a fazer o mesmo com ele. O evento tinha avisos de classificação etária. Uma mãe (coreógrafa e também artista performática) levou a filha para interagir com o artista. Foi filmada e... PEDÓFILO! CRIMINOSO! DESTRUIDOR DA FAMÍLIA TRADICIONAL BRASILEIRA!

Esses são apenas dois acontecimentos entre a dezena de censuras que a Arte vem sofrendo no atual momento. Vivemos um período de transição e polarização que a Arte insiste em escancarar. Disse Zola:
Basta ser diferente dos outros, pensar com a própria cabeça, para se tornar um monstro. Você é acusado de ignorar a sua arte, fugir do senso comum, precisamente porque a ciência de seus olhos, o impulso de seu temperamento, levam-no a efeitos especiais. É só não seguir o córrego largo da mediocridade que os tolos apedrejam-no, tratando-o como um louco.
A nudez é um dos tabus mais hipócritas que temos hoje em dia. Em nossa sociedade, pode-se usar roupa íntima na praia, mas não se pode amamentar em público. Pode-se colocar crianças maquiadas dançando eroticamente um funk, mas não se pode expor a criança à manifestações artísticas mais contundentes. Pode-se dar uma arma de brinquedo, mas jamais ir a uma praia de nudismo. Mande nudes, mas não tome banho com seu filho.

A nudez feminina vem sendo "trabalhada" há séculos, enquanto a nudez masculina se resume à estátuas gregas com folhas de parreira (castração religiosa) ou membros pequenos que não chamam atenção. Maikon K e Walter Schwartz se colocam no lugar da Olímpia e confrontam os padrões tanto da representação masculina quanto da Arte em si.

Esse é o papel da Arte (dita contemporânea) desde que as vanguardas do século 20 começaram a questionar o que vinham sendo feito em busca de maior expressividade ao invés de restrições estéticas. Técnicas e suportes foram sendo experimentados e substituídos. O corpo se tornou ferramenta e meio. Gostar ou não gostar não é mérito da Arte: isso é um problema do espectador.

Toda essa discussão só incentiva ainda mais a produção artística. Eu espero muita gente pelada por aí.

terça-feira, 29 de agosto de 2017

Ao meu lado

A quarta edição da revista Arte ao Lado é especial... porque é minha!



Tinha que lançar ainda em agosto, mês dos Leoninos que adoram aparecer... como eu (?).

sexta-feira, 14 de julho de 2017

Arte ao Lado: Raphael Zanow

Como captar o que a mente transcende? No caso de Raphael Zanow, escrevendo poesia. Mas como manter suas ideias em equilíbrio? Pra ele, jogando capoeira.

Seu movimento interno de expressão se deu na forma dessas duas artes. Uma desenvolve a outra e o permite praticar aspectos do corpo, da mente e do espírito para que suas palavras e seus gestos falem de outra forma.

A capoeira sempre foi mais do que uma arte para Raphael. Desde a adolescência, a filosofia dessa luta / jogo / dança afro-brasileira invadiu sua casa (literalmente) e o mostrou exemplos de união, de harmonia, de força e de família. Ele diz que a capoeira foi uma força que potencializou suas reflexões de como ser uma pessoa melhor. Hoje sua casa já se tornou um quilombo onde ele não só treina como também ministra aulas.

Com a entrada da Psicologia em sua vida, Raphael conseguiu refinar os processos externos e internos para escrever sobre tudo que vem à mente. Como, por exemplo:
Sou normal,
No mundo dos anormais.
Onde todos estão nesse mundo,
E ao mesmo tempo não estão,
Ou não querem estar.
Um mundo de criação,
Criado para viver.
Para o bem viver eu não sei?
É pra ser vencido!
É uma luta contra a criação.
Sua própria criação.
Você contra você.
Todos contra todos e todos juntos contra tudo e todos.
Mundo louco!
Mundo normalíssimo.
Cada situação diferente da outra,
Parecida,
Mas nunca igual.
Criação gerando criação.
De perto…
Olhos que você vê, porém, só enxerga com os seus.
Olhos que dão a visão do normal!
O seu normal.
O normal do próximo, já não é tão normal.
Mas é um normal na invisibilidade de outro normal.
Que ao mesmo tempo é vivido!
Com o desejo de ser único por um só.
Uma mistura de normalidades que englobam outras realidades.
Indiretamente tudo é respeitado para poder ser vivido normalmente.
O verdadeiro significado do nosso real?
Não sei, mas é normal eu não saber.
Pois convivemos bem nossa normalidade.
Esqueça as diferenças, pois tudo é normal.
Caso para você algo não seja normal ou tão normal…
Imagine que você que não é normal.
Assim será normalmente melhor.
Viva normalmente,
Mas não seja normal!
Em sua página do Facebook, Reflexões Poéticas da Existência, Raphael posta mais de seus textos junto com algumas leituras em vídeo.


Eu e Rapha nos conhecemos na academia, mas não foi malhando. Foi dançando! Isso mesmo: nós fazíamos aulas de street dance, step e lambaeróbica! Fazíamos não... dominávamos, né, Rapha? Criamos um vínculo fraternal forte: eu, o irmão mais velho com um pouco mais de sabedoria porém bem menos calejado; Raphael, o irmão mais novo impetuoso que abraçava a vida com intensidade.

A distância nunca desfez esse vínculo que a Arte veio agora revelar. Axé!

segunda-feira, 3 de julho de 2017

Ao Lado da Escultura

Demorou bem mais do que o previsto, mas saiu a terceira edição da revista Arte ao Lado! O assunto é escultura com Katia Politzer, Mari Leal e Alcemar Maia, ou seja, a escultura de uma forma não tão convencional assim! Leia e surpreenda-se!

sábado, 15 de abril de 2017

Arte ao Lado: Eliude A. Santos

Livros do autor.
Tem casos que a criação artística é um processo tão intenso que sai pelos poros. É essa a impressão que tive ao conversar com o escritor Eliude A. Santos. Aliás, chamá-lo de escritor talvez seja reduzi-lo a uma única direção, quando, na verdade, é apenas uma de suas válvulas de escape:
"Eu me expresso com as extremidades: com a língua e com a ponta dos dedos, donde tiro letras e traços que sussurram valores ao espírito do observador cuidadoso. Eu me expresso com empatia e com respeito. Eu me expresso com a luz e as trevas que existem em mim e que transformo em contos, romances, desenhos, pinturas, fotografias, performance, atuação, canto, música, drama, religião (e por religião eu falo de uma religação com o outro e com o que há de mais sagrado em mim)."
Porém, foi na leitura que ele encontrou um objetivo:
"Quando eu era criança, eu amava ir à biblioteca e ficava imaginando chegar numa biblioteca e ver um livro escrito por mim. Mas eu cresci e o desejo do livro físico foi ficando menos importante que o desejo de penetrar na mente do leitor e fazer um rebuliço."
Hoje nem se preocupa tanto que seus textos estejam nas mãos de editoras, mas quer ser lido/ouvido (e por isso utiliza a internet). Quer que as pessoas vejam as cores diferentes que tenta mostrar em uma visão particular e coerente do mundo que compartilha. Suas técnicas podem variar, mas a essência por trás da técnica é a mesma:
"Faço com desejo, faço com intensidade, faço com delicadeza e com força, faço com que o outro reveja o que pensa; faço com que o outro reflita. Faço com que eu mesmo me perca pra que me ache de um modo mais elevado. Faço porque eu me sentiria um covarde se não ousasse, faço porque sinto prazer em fazer; faço porque me preocupo com a visão limitada do outro; faço porque sou um libertador. Quase como um proselitismo literário, um proselitismo libertário."
Suas respostas mostram um ímpeto quase incontrolável do processo criativo. Uma necessidade de questionar o padrão e estabelecer uma reflexão, um desejo que está na base da Arte considerada Moderna desde o século XIX, quando o Romantismo deslocou o observador da obra para as intenções do artista.

Foi na internet que conheci Eliude e suas observações bem particulares sobre religião. Como sou amante de mitologia, acabei lendo um de seus livros e resolvi fazer perguntas direto pra ele através das redes sociais. E ele respondeu! Daí surgiu um contato bacana, uma conexão cheia de coincidências e similaridades que vem crescendo através da Arte.

quarta-feira, 12 de abril de 2017

Arte ao Lado: Duas de uma vez!

Vocês já estão acompanhando a revista do Arte ao Lado, certo? Se não estão, leiam logo as edições 1 e 2 porque a terceira edição já está sendo feita!

A novidade é a seguinte: eu tinha me programado pra fazer a revista ao longo desse ano, como se fosse a terceira fase deste projeto tão legal. Acontece que, de repente, novos contatos foram feitos e novos textos apareceram!

Sendo assim, a revista continua sendo a terceira fase, mas ela será intercalada com a quarta fase, ou seja, novos textos! E já começa sábado agora!

Claro que com a vida louca do jeito que está, não haverá agenda definida para isso. Será tudo feito com o tempo que deve ter. Então, divirtam-se!

domingo, 12 de março de 2017

Novo volume da revista Arte ao Lado

Tem tudo sido tão corrido que nem escrevi aqui que o segundo volume da revista do projeto Arte ao Lado saiu!

Com um cheirinho de nostalgia, a edição traz o Desenho mais do que bem representado por Letícia Vicentini, Sidney Chagas e o mestre Amador Perez.



Ah... e o "quem sabe" pela continuação do projeto pode estar virando um "com certeza"...

domingo, 26 de fevereiro de 2017

Uma reflexão...

Freedom (is) Truth (or) Relativity (?)

quarta-feira, 1 de fevereiro de 2017

Arte ao Lado: A revista!

O Arte ao Lado saiu do blog e se tornou uma publicação! Isso mesmo! Nesse primeiro volume, os três fotógrafos – Fernando Gonçalves, Reinaldo Smoleanschi e Victor Haim – tem suas postagens transformadas em matéria. Clique AQUI e leia!

Aos poucos os outros também aparecerão! E quem sabe alguns inéditos? :)

segunda-feira, 16 de janeiro de 2017

Arte ao Lado: Eu

Isso mesmo... resolvi me colocar no lugar dos meus entrevistados. Já que tem sido tão difícil conseguir depoimentos, nada melhor do que experimentar do "próprio veneno" pra ver se é tão complicado mesmo. E olha... fácil não é, mas também não é nenhum bicho de sete cabeças. E eu nem sou artista; sou designer e professor, e me aventuro pelo mundo da nossa língua.

Bom, seguindo as perguntas que fiz a todos... o que eu faço é brincar com as palavras, desde o som às letras que as compõem. Sempre fui fascinado pela nossa língua e me lembro de ter passado mais de uma semana com a palavra "papoula" ressoando na minha mente. Quando aprendi as figuras de linguagem na aula de português da minha inesquecível professora Auxiliadora, senti que as possibilidades eram enormes. Aliás, foi na aula dela que escrevi meu primeiro poema iludidamente construtivista e totalmente cliché:

DÚBIO PREDICATIVO
Por que Sertão?
Ser tão pobre.
Ser tão miserável.
Ser tão infértil.
Ser tão seco.
Ser tão desesperançoso.
Ser tão morto.
É.
Por isso somos tão.

Daí vieram os sinônimos, antônimos e a noção que nosso idioma é realmente rico. As palavras foram amadurecendo dentro de mim e em 2000 participei de uma exposição coletiva chamada DaGema, com a obra DicionáRIO.


A vida foi tomando outro rumo até que entrei no universo acadêmico que me fazia complicar o fácil, ser prolixo porém conciso e claro. Em 2010, a porteira se abriu e a produção começou. A maioria já apareceu aqui no blog:

  1. enGARRAFAmento
  2. Banco de DADOS
  3. emPILHAmento
  4. indigNAÇÃO
  5. É, nem... nem é!
  6. Rio de Janeiro a Novembro de 2010
  7. Direitos Humanos para Humanos Direitos
  8. Direito Civil: onde já se viu? (em gênero, número e grau)
  9. Luto - Luta
  10. Arranquem o SiSU
  11. Irã. Irá? Ira!
  12. COMUNIDADE
  13. FRIO
  14. Cética Ética ETC... e a variação CosmÉTICA
  15. Afeto Afeta
  16. Deus Juiz
  17. Muda.
  18. Sabia, sábia sabiá?
  19. B! (Anagrama)
  20. entre outros...

Mas dando sequência nas perguntas... como eu faço isso? Olha... não tem muito uma fórmula. Normalmente, quando alguma palavra me pega, eu a anoto e deixa ela amadurecer. Assim que ela precisa sair (e eu tenho tempo), eu vou pro computador testar espaços e tipografias. Tenho as tipografias prediletas e os formatos e cores mais ou menos queridos, mas tudo está aberto para o que a palavra quiser.

Agora vem a pergunta mais difícil, provavelmente aquela que empacou com todo mundo: POR QUÊ? E eu não sei responder mesmo. Eu faço porque eu quero, porque eu preciso. Não é só uma forma de expressão, é a criação de algo e ao criar me sinto dando vida. Algo nesse mundo passa a existir porque eu fiz. Esse tipo de poder é único, comparado talvez à geração paterna/materna.

É isso. Esse é meu lado artista, meu lado criador (e ontem esse blog fez 9 anos!).

domingo, 4 de dezembro de 2016

"A arte existe, porque a vida não basta"

Este ano o Centro Cultural do BNDES montou uma exposição para comemorar os 85 anos de carreira de Ferreira Gullar, que tive a oportunidade de conhecer com meus alunos.

Entrada da exposição.

A exposição traçou uma linha cronológica com textos, vídeos, livros, objetos, fotografias, pinturas, colagens e até músicas feitas por esse múltiplo artista maranhense.

Poema Sujo (1976), um dos principais poemas da literatura brasileira.
Poema Enterrado (1959), apresentado pela primeira vez em público.

Eu já conhecia alguma de suas obras por três razões: (1) dou aulas de Arte e um professor de Arte não pode desconhecê-lo; (2) sou fascinado pelo Concretismo/Neoconcretismo do qual ele fundamental; e (3) julgo que minha veia artística se inspira no que foi feito por Gullar. Ainda tive a oportunidade de ver este ano o Manifesto Neoconcreto escrito por ele na Tate Modern, em Londres (abaixo).


Há alguns anos atrás, ele apareceu na mídia contando sua história de vida por causa de seus dois filhos com esquizofrenia, assunto que, naquela época, estava sendo retratado em uma novela. Mas o grande público não sabia de sua capacidade de dizer tudo com poucas palavras. Sinceramente... acho que nunca soube.

É dele a sábia frase que entitula esta postagem. Agora, em sua morte, espero que ele seja elevado ao seu lugar de direito, ao hall dos grandes artistas brasileiros, responsável por mostrar ao mundo nosso potencial para a Arte.