sexta-feira, 19 de julho de 2019

Desequilíbrio estável

Em parceria com o Zentrum Paul Klee, de Berna, na Suíça, o Centro Cultural do Banco do Brasil trouxe pela primeira vez na América Latina mais de 100 obras do suíço Paul Klee (1879-1940), dentre elas pinturas, gravuras, fantoches e, em sua maioria, desenhos. A exposição está na filial do Rio de Janeiro, após temporada de sucesso em São Paulo, e ainda irá passar por Belo Horizonte e Brasília. Klee transitou por diversos movimentos de vanguarda e fica até difícil encaixá-lo em um estilo definitivo, porém, é indiscutível sua importância na Arte Moderna e Contemporânea. Por essa razão, receber essas obras é algo a se comemorar, pois o público brasileiro carece da presença de grandes artistas internacionais.


Dito isso, é preciso que tenhamos uma avaliação mais criteriosa sobre as exposições e as obras que chegam no Brasil. Das 123 obras, talvez 5% tenha alguma relevância artística. A partir desse dado já é possível ter duas formas de reflexão: na primeira, celebramos o contato com tantos trabalhos inéditos que amplia os conhecimentos sobre o artista; e, na segunda, entendemos que são obras, em sua maioria, de menor valor ou importância que precisavam sair dos acervos para elevar o valor de mercado e “levar cultura” para os brasileiros. O interessante de ambas reflexões é que elas não são excludentes, mas sim potencializadoras de um questionamento maior sobre a disponibilização de cultura em nosso país. Entretanto, a segunda reflexão se torna mais vigente quando nos atentamos para o projeto expográfico realizado no Rio de Janeiro, marcado por três pontos bem simples.

A primeira sala da exposição trata dos desenhos iniciais de Paul Klee, mostrando como ele saiu de um desenho academicista – inclusive com uma belíssima marina — para suas experimentações visuais. No entanto, ficamos sem saber a idade que Klee desenvolveu os desenhos, porque o texto de introdução do artista foi preterido em nome dos textos curatoriais. Mesmo que a ideia da exposição fosse quebrar com a ideia de cronologia (o que não foi) ou exposição didática, a informação fica perdida e tanto a sala quanto as obras ficam mal aproveitadas. Detalhe: o texto de introdução ficou na terceira sala.

Ao passar para a segunda sala (uma espécie de antessala) somos apresentados aos alardeados (e muito interessantes) fantoches de Klee... mas em forma de vídeo, porque eles mesmo foram colocados no fim da terceira sala, totalmente deslocados. Se tinha alguma contextualização, ela não apareceu.

Por fim, um facsímile de péssima reprodução do “Angelus Novus”, de Klee, encerra com a certeza de que o material é realmente de deixar dúvidas. Ficam as perguntas: para que o facsímile? Só para mostrar o que Walter Benjamim falou sobre ele, validando-o como se ele precisasse disso? Seria para dizer que tinha alguma coisa importante do artista? Bom, a exposição, ao menos, oferece ao visitante a oportunidade de ver a última obra de Klee, “A última natureza morta”, de 1940, ainda inacabada. Só não sei a razão de estar completamente perdida na penúltima sala sem qualquer destaque.

Sem título (Última natureza morta), óleo sobre tela de Klee (1940).

Uma exposição que possui uma logística gigantesca – por exemplo, a temperatura do local não pode ser superior a 20° para evitar danos aos quadros e impedir que a tinta derreta – de um artista tão importante merecia um olhar curatorial mais cuidadoso. Isso seria capaz de nos levar àquela primeira reflexão (e quem sabe, nem chegarmos à segunda), onde celebramos e curtimos a vinda dessa arte seminal.

Nenhum comentário: