sábado, 12 de setembro de 2015

Arte ao Lado: Mari Leal

“O que é arte?” é uma pergunta que nem passa na minha cabeça querer responder. Suas tênues linhas com o artesanato tornam ainda mais complexa a questão. No entanto, não é nada de difícil olhar o trabalho de Mariana Leal e chamar de arte.

Não me pergunte como ela fez esse bolo de cabeça pra baixo. S-E-N-S-A-C-I-O-N-A-L!

Como você percebeu, Mariana faz bolos modelados em pasta americana, personalizando-os de acordo com o tema encomendado (quase impossível escolher as fotos!). Ela me contou que leva em torno de dois dias: no primeiro, realiza a parte de confeitaria (assar, preparar recheios, rechear, prensar, preparar o bolo para receber a pasta americana… e você sabia que tinha isso tudo? Pois é… nem eu!) e, em seguida, começa a parte artística (cobrir o bolo com pasta americana, desenvolver as modelagens e finalizar). Mas essa é a - literal - mão na massa! O trabalho começa no minuto que chega um pedido.


Ela diz que muitos clientes chegam com ideias fechadas e imagens para cópia, acompanhadas da frase “quero igual”. Porém, Mariana não imita trabalhos dos outros (nem mesmo o próprio!) e deixa claro que vai se inspirar no que foi apresentado para criar um bolo original. Até agora: satisfação garantida. E, quando ela ouve “faz do jeito que você quiser”, aí a criatividade se esbalda em diversão. Ah… esqueci de falar o primordial: os sabores e as texturas são ótimos! Nada de bolo seco sem graça! Gente… o cupcake de churros é de fazer vergonha e enfiar tudo na boca!


Mariana era (e ainda é!) a menina bonita da escola. Eu estudava de manhã e ela à tarde e, mesmo assim, sua beleza era lendária! E não pensem que era só isso, porque a bela virou advogada. Os bolos eram hobby, mas a excelente qualidade do resultado transformou a brincadeira em trabalho (“vivo deles e para eles”) e a carreira no Direito ficou pra escanteio. Ela diz que, apesar de ter sido uma difícil decisão, hoje ela tem a qualidade de vida que queria para cuidar da família que construiu com meu melhor amigo de infância!

quarta-feira, 9 de setembro de 2015

Festa no céu

A morte é um fato inexorável. Mas somos tão apegados que a ausência e a perda nos tira do eixo. As diversas culturas deste mundo tentam dar explicações que possam amenizar esses sentimentos duros, a maioria falando de um além-vida maniqueísta, onde ou você foi bom em vida e vai para um tipo de paraíso ou você foi mal e irá sofrer pela eternidade. E ainda tem aquelas que falam numa reencarnação punitiva.

Mas o México tem um outro jeito de lidar com isso. A animação Festa no Céu (The book of life, 2014) nos conta que os mexicanos separam o outro lado nos Lembrados e os Esquecidos. Por mais previsível que seja o enredo da animação - triângulo amoroso que todo mundo sabe como vai terminar -, a mensagem é interessante: faça de tudo para ser lembrado em vida positivamente e você viverá em festa! É preciso rever o passado, mas não segui-lo à risca, pois cada um tem sua própria a história a escrever.


Quero conhecer mais sobre o Dia de los Muertos: o dia que não se lamenta as perdas, mas se celebram às vidas! Muitas cores vibrantes transformam o ícone sinistro da caveira num estilo visual único. Aliás, a animação tem um estilo de bonecos de madeira que o torna ainda mais incrível. Um frescor no meio de tantas animações relativamente iguais, que vale a pena ser visto.

sábado, 5 de setembro de 2015

Arte ao Lado: Felipe Zúñiga

Felipe Zúniga é filho de Luiz Alberto Zúniga (pra sempre aquele abraço sinestésico) e Cíntia Kury. Eu poderia escrever parágrafos de elogios aos meus dois mestres eficientes, geniais, simples, doces, acolhedores… ih comecei… mas não. Agora é hora de falar da maior criação dos dois, desse artista visual que meio que vi crescer à distância (papo de tia velha).

Ao convidar amigos, conhecidos e familiares para este meu projeto, fiz três perguntas que seriam o norte para um texto escrito por mim. Já de cara recebi o seguinte do Felipe:
“O processo criativo é um assunto deveras cabeludo, mas não é imune a eventuais cortes na barba e vez ou outra sintetizar a coisa. Vou sentar com as tuas indagações e bancar o Louco do tarô. ‘O que você faz?’ imediatamente me lembrou de uma colocação do Faulkner: An artist is a creature driven by demons. He doesn't know why they choose him and he's usually too busy to wonder why. Abraço venusiano”
Percebi que coisa boa viria por aí. E, quando recebi as respostas, vi que não poderia editá-las. Algo genial se perderia no caminho. Portanto, colocarei-as aqui na íntegra e aconselho que sejam lidas em sua totalidade:
O que você faz?
Antes de homo faber, de artífice, eu sou aquele que testemunha, o observador. Todo artista é em essência um observador e um interprete do que captou. Cabe ai a ideia de canal também, de antena parabólica para tudo que acontece por ai, em todos os níveis. Alguns dramatizam aquilo que lhes afeta – ou a palavrinha odiosa ‘problematiza’. Eu estou a serviço da egrégora da arte através das minhas criações. O que eu faço é ousar enxergar o invisível, ir além, materializar o espirito ou espiritualizar a matéria.
Hits of sunshine. Nanquim, ecoline, papel de origami, colagem sobre papel.
Como você faz?
Miles Davis. Técnica mista sobre gatorfoam.
A apropriação de imagens e a possibilidade de (re)significá-las surgiu há dez anos atrás depois de uma longa jornada de experimentação com diversas linguagens. Sempre desenhei, mas, não encontrava uma verdade ali, havia uma discordância entre o que eu queria obter em termos gráficos e o que de fato obtinha, dentro das minhas limitações, com o material. Com a pintura foi a mesma coisa, só mais adiante é que eu percebi que eu pintava... Com tesouras. Meu background é totalmente musical – incluindo aí layout de capas de discos, posters, cenografia – design gráfico, manipulação analógica de fotografia e tudo relacionado à 7ª arte e mais recentemente à ópera. Sou uma esponja. Mergulho intensamente em um assunto e vou estabelecendo associações ou pontes dentro dessas linguagens. Todo o pensamento por trás das minhas colagens vem dessa amálgama de mundos, que são opostos/complementares. Não penso apenas na imagem estática, muda, deslocada. Eu vejo interação entre as formas, busco referencias fora-da-caixa, não obedeço a narrativas ou posso partir de uma e depois desconstrui-la.
Do the astral thing. Colagem sobre papel.
Todo processo de criação é uma libertação, tanto em um nível emocional quanto material. Quando concluo eu já sei que não me pertence mais, é do mundo. A descarga energética varia de projeto para projeto, mas, há sempre naturalidade e leveza, não faço parte desse clichê de artista torturado, tudo é um parto sem anestesia. Acho um exagero e até forçado, não se deve perder a ternura jamais. Você é o médium prestes a transformar algo, a gestação pode ter suas turbulências e a criatura nasce como um trovão, mas se for desgastante e não houver prazer há algo de errado aí. Tudo o que produzo é uma aventura, me sinto como O louco do tarô, prestes a se jogar no abismo. Desvendar ou desvelar pouco a pouco uma ideia é algo absolutamente mágico. Descobrir quem é, qual a intenção disso, o que estou querendo comunicar aqui. Esse processo de analise é intermediário a finalização, se é que podemos chamar disso. Eu acredito que um trabalho nunca está pronto, ele apenas para em lugares interessantes. Isso me fascina e ao mesmo tempo enlouquece, pois há um infinito de outras soluções que poderiam ser dadas ou narrativas que poderiam ser esculpidas... Talvez por isso alguns artistas optem por criar variações sobre uma mesma forma, ideia ou cor. Eu gosto de retornar a uma ideia que não gostei e desenvolver um novo olhar sobre aquilo. Não tenho medo do erro. Esses ‘’acidentes’’ podem muito bem transformar uma imagem banal em um ser magnifico. Tudo esta na maneira como se olha, na intenção desse olhar.
Para essa série que estou trabalhando agora – as 78 laminas do Tarô – resolvi abrir espaço para novos elementos e experimentar uma nova rotina de produção. Aliás, rotina de trabalho também é processo criativo, garimpar material idem. Toda vez que eu inicio uma nova jornada eu nunca sei exatamente aonde aquilo pode me levar, essa descoberta é a força motriz. A confecção de uma colagem pode ter inicio antes mesmo de pegar no estilete, tesoura e papel. Fica fermentando dias na minha cabeça, já tenho a imagem pronta, resta saber como materializá-la. E ai se dá essa loucura que é para o colagista ou quem vive de apropriação: a caçada ao material. Às vezes o próprio trabalho vai me informando como e o que devo procurar. Tenho, naturalmente, minhas predileções, e elementos que invariavelmente fico repetindo e aperfeiçoando a cada colagem. É um processo orgânico, desde a escolha da imagem até as camadas, sobreposições que vão surgindo. Não se pode obrigar um trabalho a ser isso ou aquilo, querer confiná-lo em uma ideia. O grande barato está em ir descobrindo seus segredos aos poucos, deixar-se guiar pelo sensorial, se sentir provocado.
O Imperador, a Imperatriz, o Hierofante e a Sacerdotisa. Colagens sobre gatorfoam.
Os Enamorados, o Enforcado, o Diabo e a Morte. Colagens sobre gatorfoam.
Não acredito em inspiração, nem em writers-block. Isso mixaria. Há naturalmente estímulos e ‘’dieta de criação’’ que consiste em se cercar daquilo que pode servir de referencia, expandir os horizontes, abrir o canal e estar aberto para o novo, o inimaginável. É ai que entra a música e o tarô, são os meus portais para abrir o canal com o invisível. Se não está saindo naquele dia, eu aceito e desapego, retorno no dia seguinte. É importantíssimo ouvir o que aquele trabalho está lhe comunicando, as respostas estão ali, mas é preciso mudar a atitude para conseguir perceber as sutilezas. Nesse sentido a pressa é a inimiga da perfeição, tudo que envolve criação tem um tempo próprio, tem uma maturação. Não dá para apressar senão desanda e ai vem essa baboseira de falta de inspiração. Tem que haver continuidade, constância senão não se evolui. E isso é um processo vitalício, ninguém nunca está 100% pronto.
Colagem em escrivaninha.
Por que você faz?
Tem uma frase de Viktor Frankl que sempre gostei que diz: What is to give light, must endure burning. Isso me dá vida e eu dou vida em troca. Captar, imaginar, abrir novos horizontes, materializar, servir e consolidar, me vitalizam. Sem desejo, sem maravilhar-se não se sai do lugar, você envelhece, empobrece a alma. Estou cumprindo o meu decreto nessa 3ª dimensão. Eu me fortaleço, cresço e aprendo muito criando e dividindo o brilho do que faço. Sou um canal a serviço do invisível, não é uma escolha, simplesmente É. Mana (Axé, iluminação) dos meus ancestrais... Fora os diversos aspectos deliciosos no meu mapa. Isso é um decreto.

Liebestod. Colagem sobre papel.
Quando ele escreve que pinta com tesouras, me lembro do seminal Henri Matisse (e do álbum Jazz). Quando vejo suas colagens, me lembro de Richard Hamilton, um dos pioneiros da Pop Art. Não estou fazendo comparações - longe de mim -, mas, em muitos pontos, me peguei impressionado com a maturidade criativa de Felipe, como se ele tivesse encontrado o nirvana espiritual que todo artista busca em sua trajetória. Isso se deve ao fato dele ter 29 anos e eu estar com a tal "Síndrome de Tia Velha".

Me senti inspirado a fazer uma aliteração: “Foda, Felipe. Fez fãs”.

sábado, 29 de agosto de 2015

Arte ao Lado: Letícia Vicentini

Doce, sorridente e delicada, Letícia Vicentini era aquela aluna fofa. Os professores sempre esperavam muito de seus resultados por sua dedicação e bom gosto. Já se via em alguns trabalhos o seu empenho e aquele brilho no olhar que aparece no momento de criação do artista. Mas preciso confessar: a escola não deixou ela dar vazão ao seu real talento. Posso dizer isso agora que comecei a ver o que ela desenvolve para a faculdade.

Desenho em aquarela, lápis de cor e nanquim para aula de ilustração de produto.
Exercício em grafite.

Mesmo estando voltada quase que exclusivamente para o curso de Desenho Industrial da PUC-Rio e para o estágio no IP Studio, Leticia está sempre tentando variar e aprender novas técnicas. Desenho, pintura, escultura, depende da técnica e do projeto, não sem antes fazer vários esboços e ver referências. Ela diz que vai modificando constantemente o trabalho até chegar em um esboço que considera “aceitavel”:
Me sinto “realizada” quando eu imagino algo e consigo passar o que eu imaginei para o trabalho, seja para o papel ou computador, ou o que for. Então, quanto mais técnicas eu souber, mas interessante serão os resultados imaginados.

Olha… isso deve ser difícil pacas pra ela, porque o perfeccionismo faz parte da pessoa. Repararam nas aspas que ela usa? Isso tem dois lados: o bom é a busca contante pelo melhor; o ruim é a insatisfação garantida, porque nunca vai estar no nível que realmente gostaríamos. Por isso, acho que, quando ela divulga os desenhos que faz por diversão, conseguimos ter um vislumbre da ponta do iceberg que é o potencial dessa menina.

Boca em lápis de cor.
Darth Vader em Bic.
Desenho em grafite.

E fico feliz em saber que Leticia faz os trabalhos da faculdade com gosto. Percebo pelas suas palavras que ela tem como objetivo abrir ainda mais seus horizontes criativos. Como fui seu orientador de Projeto Final do Curso de Comunicação Social do Instituto de Tecnologia ORT (jabááá!!!), me sinto como um dos responsáveis por tê-la colocado na frente de um possível caminho a seguir na vida.

sábado, 22 de agosto de 2015

Arte ao Lado: Fernando Gonçalves

Fernando Gonçalves é fotógrafo e professor, graduado e pós-graduado em Comunicação. Em uma era onde a quantidade e a velocidade da informação de certa forma anestesiam nossa capacidade de percepção e de apreensão das coisas, ele gosta de discutir os limites do conhecimento e da representação do mundo e as possibilidades de sua transformação através da imagem. Seu trabalho fotográfico, então, propõe desconstruir nossa percepção do cotidiano, explorando a capacidade que linhas, volumes e texturas têm de produzir outra coisa. Lugares e coisas reais - e ao mesmo tempo inventados - se tornam formas inusitadas com forte carga pictórica que nos convidam a criar e recriar nossas próprias imagens do mundo.

Zebra, 2011.
Snow steps, 2008.

Procura ser fiel à cena que se apresenta pelo acaso independente do equipamento, ou seja, nunca sai com objetivo de apenas fotografar (“É a coisa que me acha”). Por não ter formação em fotografia não realiza intervenções digitais no computador. Como ele mesmo diz:
“O que importa pra mim não é o registro em si, mas construir uma imagem a partir daquilo que vejo, por meio da regulagem da luz e dos pontos de vista e de enquadramentos que favoreçam e valorizem esse ou aquele aspecto da cena que eu crio no meu olho e com a ajuda do olho da câmera. Procuro mostrar que às vezes mesmo na coisa mais banal e mais improvável pode haver beleza, mas que para isso é preciso estar atento.”
A rocha, 2011.
Masp, 2013.

Conheci Fernando como coordenador do Escritório Modelo de Relações Públicas da UERJ (pra sempre ERP, nada de LCI - piada interna), onde trabalhei como designer por quatro importantíssimos anos da minha vida. Sempre aparentemente calmo e de discursos precisos, trazia resoluções quando estávamos empacados e também questionamentos quando ficávamos no cliché e precisávamos de um empurrão. Me lembro de ter procurado por seus conselhos quando pensava em fazer mestrado. E agora enxergo que seu trabalho fotográfico segue o reflexo de quem ele é. Me parece que a busca pela desconstrução para construir e propor novos diálogos entre as imagens e o olhar se manifestaram de inúmeras formas em seu trabalho como educador e profissional de comunicação.

Ponto de Fuga, 2004.
Vítreo, 2012.

Fico feliz de saber que concordamos com a necessidade de criar beleza no mundo, “belezas que também sirvam para fazer pensar e causar um certo estranhamento, mas sem perder a poesia”.